Reforma Psiquiátrica: uma viagem pela Psiquiatria Preventiva dos Estados Unidos


Olá, caros leitores sejam bem-vindos ao último post dessa semana! Iremos abordar sobre a Psiquiatria Preventiva que ocorreu nos Estados Unidos, o país estava em um momento de grande transformações culturais, políticas e econômicas.

John F. Kennedy assinando o decreto
A Psiquiatria Preventiva desenvolveu-se nos Estados Unidos a partir da década de 1960, após a realização de um senso em 1955 que revelou as péssimas condições dos hospitais psiquiátricos, além da violência e os maus tratos com os pacientes. Neste período os Estados Unidos enfrentavam situações críticas, como: a Guerra do Vietnã, o aumento do consumo de drogas, o surgimento de gangues, etc. Desse modo, em 1963 com decreto de de John F. Kennedy, Community Mental Health Act (Lei da Saúde Mental Comunitária), e a publicação do livro “Princípios da Psiquiatria Preventiva” de Gerald Caplan levou a uma mudança na prática da psiquiatria. 

O projeto da Psiquiatria Preventiva tinha como objetivo reduzir o desenvolvimento das doenças mentais na sociedade, além de promover a saúde mental. Gerald Caplan propôs uma teoria inspirada no modelo da História Natural da Doença, ou seja, o processo de adoecimento desde o início até a sua resolução. A proposta da Psiquiatria Preventiva, portanto, seria de identificar a doença mental precocemente, sendo possível intervir e prevenir o surgimento ou o desenvolvimento da doença mental erradicando assim os males da sociedade, além de tornar obsoleto os hospitais psiquiátricos. 

Desta forma, emerge uma necessidade de identificar indivíduos que fossem suscetíveis a desenvolver uma doença mental. Os indivíduos que suspeitavam ter um desvio ou distúrbio eram encaminhados a um psiquiatra para realizar-se uma investigação diagnóstica. O encaminhamento podia ser por iniciativa própria ou por recomendação de familiares e amigos ou por um profissional. Foram aplicados, também, questionários na população para identificar possíveis “suspeitos” que precisavam de um tratamento psiquiátrico.
A prevenção da saúde mental, portanto, ocorreria em três níveis, sendo eles a prevenção primária, secundária e terciária. Como apontado por Birman e Costa (1998: 54 apud Amarante, 2013):
1) Prevenção Primária: intervenção nas condições possíveis e formação da doença mental, condições etiológicas, que podem ser de origem individual e (ou) do meio; 
2) Prevenção Secundária: intervenção que busca a realização de diagnóstico e tratamento precoces da doença mental; 
3) Prevenção Terciária: que se define pela busca da readaptação do paciente à vida social, após sua melhoria. 
Essa proposta introduziu três termos importantes: crise, desvio e desinstitucionalização. O conceito de crise advém da sociologia e parta da noção de “adaptação e desadaptação social”  e permitiu olhar além da concepção limitada da doença mental. As crises foram classificadas em evolutivas e acidentais. As crises evolutivas estão relacionadas ao processo considerado normal de desenvolvimento físico, emocional ou social, isto é, quando um indivíduo no período de transição perdesse sua caracterização anterior sem adquirir uma nova gerando conflitos que poderiam conduzir ao desenvolvimento da doença mental. Enquanto que as crises são impulsionadas por alguma perda ou risco, como situação de desemprego, divórcio, a morte de alguém. O sofrimento emocional provocado pela crise poderia levar ao surgimento do distúrbio mental.
Foi a partir destes conceitos que a Psiquiatria Preventiva assumiu características de uma saúde mental comunitária, pois, desenvolveram-se ações de teor comunitário. Os profissionais da saúde atuavam tanto na identificação como na intervenção das crises individuais, familiares e sociais. Por fim, o conceito de desvio também foi apropriado pela Psiquiatria Preventiva, indicando comportamentos anormais ou pré-patológico, ou seja, comportamentos caracterizados como desadaptados (i.e., desviava das normas sociais). 
Um outro termo importante que surgiu no âmbito da Psiquiatria Preventiva foi o conceito de desinstitucionalização. A desinstitucionalização referia-se a um conjunto de métodos que visavam reduzir a entrada ou o tempo de permanência dos pacientes nos hospitais, além de promover as altas hospitalares. A desinstitucionalização, portanto, tornou-se uma das principais diretrizes da política de saúde mental nos EUA. Foram desenvolvidas algumas estratégias para a efetivação dessa política de desospitalização, como: centros de saúde mental, oficinas protegidas, lares abrigados, etc. Desse modo, o hospital tornaria-se um recurso obsoleto na medida em que fosse diminuindo a incidência das doenças mentais por meio das ações preventivas. 
É possível concluir que, assim como a Psiquiatria de Setor, a Psiquiatria Preventiva superou a atuação tradicional que centrava-se em asilos e instituições. Possuiu como pauta a prevenção do adoecimento mental e a desinstitucionalização dos indivíduos. No entanto, essas medidas de prevenção serviram apenas de “captadores” aumentando, assim, o ingresso de novos indivíduos nos hospitais psiquiátricos. A Psiquiatria Preventiva, para alguns autores, expandiu o saber médico-psiquiátrico impondo novos conjuntos de normas e princípios sociais, isto é, propunha novas formas de controle e disciplinamento social.


Referência:
Amarante, P. (1998). Loucos Pela Vida: A Trajetória de Reforma Psiquiátrica no Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Fiocruz.
Amarante, P. (2013). Saúde Mental e Atenção Psicossocial. 4ª ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz.

Comentários

Postagens mais visitadas